domingo, 29 de novembro de 2009

Depoimento ( 7 )*



HALLAI HALLAI VISIONS







Mr.Lee ,o pioneiro , cowboy implacável, símbolo da música local ; contra tudo e contra todos; cuja atuação estava mais ligado a marcha da civilização dos músicos gaúchos pela conquista de um espaço coast to coast .
Na bagagem mais de 4.589 búfalos mortos por dia, nas ruas e nas ondas de Porto Alegre City , para mostrar que “santo de casa também, faz milagres “.

Este era o clima feérico e cinematográfico da época , tal era a energia, que rolava
no “ Mister Lee In Concert”, nos dias que antecederam a viagem a Curitiba.



HALLAI*HALLAI*
Mr. Robson*Paulinho Velho Xerife & Necão Cast.*
“ A linha esta traçada /
O destino marcado /
Os ventos de agora /
Voarão amanhã /
Como o presente agora /
Será depois passado /

A ordem esta
A desaparecer rapidamente /
E os primeiros de agora /
Serão mais tarde os últimos /
Porque os tempos estão a mudar
Bob Dylan / 1964
(The times they are a –changin’)

P / Nanda – Como foram os dias antes desta viagem histórica, eu acho que esta experiência foi a única com estes paradigmas todos..som local, Rádio Continental,
músicos de Porto Alegre, e também um momento difícil pois o caldeirão cultural de
nossa cidade sempre foi muito estranho aos ouvidos de outros estados ?

R / Necão – O Júlio preparou tudo, mandava toda semana para Curitiba fita gravada do programa Mr. Lee, e a Rádio Iguaçu colocava no ar toda aquela energia musical aki de Porto Alegre...não sei realmente como isso se deu, mas tudo que se plantava se colhia , e não tinha manipulação nos acontecimentos.
Era uma coisa muito forte, muita garra e inventividade.

P / Lucas – Então, aquele lance “coast to coast “, não era uma invenção , aquilo realmente estava na cabeça do Mr. Lee ?

R / Necão – Sim , a formação dessa idéia não veio assim de uma piração, tudo estava se encaminhando para um crescimento profissional do próprio movimento.
A tendência era esta, todos na época estavam vivendo uma espécie de desnacionalização completa (75/ 76), a ressaca de todo aquele nacionalismo dos militares ...; então a nossa” válvula de escape” era o sonho, e através da música
pensávamos em expandir esta matéria prima que estava sendo feita nos estúdios da Continental...o imaginário coletivo do “Vivendo A Vida” levava a todos estes pensamentos de expansão a novos horizontes.

P / Fanni - O pensamento do “Vivendo” se acreditava musical e não político ,
então , eu acho que o Vivendo a Vida de Lee , tinha todas as condições de
cair na estrada e realizar o “Coast of Coast”, a época era propícia e estava tudo
começando a se encaminhar com a viagem a Curitiba .

P / Marco – “ Pego a mala depressa, uma promessa não vou quebrar, vou para CURITIBA, ouvir as flautas de muito além. ? ( palmas ...palmas) klap...klap...klap...

R / Necão – Antes da viagem eu estava passando por um período de muita Turbulência , dentro do Grupo as coisas não estavam bem, muitas confusões,muito cansaço de tudo,muitas animosidades, o Hallai ,além da parte musical,tinha um consultório “freudiano”, o Paulinho foi um que,exorcisou todos os demônios dentro do grupo, o Robson não aceitava muitas atitudes do Paulinho,o Sergio, também reclamava muito ...estava naquela fase ...ser ou não ser....não sei se caso ou compro uma escada?...problemas e mais problemas....este acorde não é com sétima...o baixo tem que conduzir ....tem que ter balanço....aniversários de 15 anos, eu tenho que ir....vestibular ? De novo! O Robson fez todos os vestibulares possíveis no tempo do Hallai Hallai... O Paulinho ficava “puto”, pois quando acontecia isso, os ensaios iam” pras cucuias”..”.De novo, não é possível, assim não dá”...Necão que barbaridade...já pensou se fosse numa apresentação.
O Paulinho estes dias me disse assim:”Necão , eu só fiz “cagada” na minha vida”!
O “veio” tem consciência de tudo”,...mas pessoal, o Hallai tinha uma sala “Sigmund Freud”...o consciente e o inconsciente e, conforme o Sig, os impulsos e desejos , vem do nível inconsciente...e disso não seríamos nós do Hallai, que iríamos escapar... ..na arte da música, talvez com muito mais intensidade...pois revira todas as camadas do ego ...e ninguém aceita todo tempo viver esta catarse , sem colocar ma mesa o seu próprio “ego”...num grupo vocal tudo isto é muito mais intenso... por isso meu amigo, os grupos vocais são tão raros...!

P / Nanda – Necão , como é que tu vivia no meio destes impulsos , porque tudo
que se repete demais, leva a uma profunda hostilidade ?

R / Necão – As neuroses começaram aos poucos , no dia-dia...nos concertos da Lee, nos ensaios, e quando estava em plena eclosão , surgiu o Concerto em Curitiba , já estávamos em 1976... e tudo começou no ano de 1975...tudo foi num crescente...mas eu, acreditava no potencial do grupo, e naquele momento era com eles o Hallai.

Caras, eu ficava entre cristais tentando não deixar cair os copos...sabia de todo potencial musical do pessoal e os compromissos com o “Vivendo” , estavam estourando nas datas...além disso tudo , eu trabalhava numa empresa que tinha um audacioso plano de marketing ,e contava com 8 relações públicas para tal tarefa , era uma Empresa que tinha sede no bairro Navegantes, e locou um escritório no centro da cidade para executar o plano...era mais ou menos assim:Nossa tarefa era entrar no meio de um monopólio que era dominado pelos representantes de confecções,mais os lojistas, mais os que transportavam as mercadorias...todos judeus , a empresa que eu representava era de origem italiana...e o plano deles era destronar toda esta confraria comercial...isto dá no mínimo um “longa” pra concorrer em Gramado...além do meu cargo , eu comecei também a fazer parte da equipe de marketing, que tinha reuniões desgastantes na formatação deste plano de derrubar este monopólio...bem isto dá uma novela pra Globo passar em horário nobre...um dia eu conto...tipo assim Raimond Chandler...muita intriga...espionagem...mentira , sexo e vídeo tape...
( risos...algazarra...risos conta ...conta...).

P / Lucas – Mas , Necão...tudo isso no meio desta viagem para Curitiba...?


P/ Fanni – Necão isto é fascinante , esta galeria de fatos rodeando o “Vivendo”?

R / Necão - O Júlio reuniu o pessoal e avisou : ” Vamos pra CURITIBA , que o
O Mr. Lee está estourado lá... preparem o melhor de cada um de vocês...que a coisa começou a ficar séria.”... eu e Paulinho saimos da Continental, olhamos a rua da Ladeira (General Câmara) e ficamos em silêncio pela segunda vez , coisa rara entre nós...”caminhando e cantando seguindo a canção “...esta era a história que estava se aproximando, através da música e pela música iríamos atravessar o Mampituba, finalmente !!!

E aí o que aconteceu ?

Marco, Nanda,Lucas e Fanni ..(todos juntos)... “foram pra pça Rui Barbosa comer
cachorro quente com duas lingüiças com trema “... (risos ...risos...muitos risos)
Ninguém é de ferro !

 
P / Marco – Este “cachorro”... ainda existe algum vestígio...?

R / Necão – Não digo este, mas as coisas se repetem, depois, alguns anos depois, não apareceu o “ cachorro do rosário”... aquela Porto Alegre romântica ainda existe, é só ter dois caras sonhadores como eu, e Paulinho que você descobre, caminhando pela cidade e entrando em lugares ao acaso...o acaso é Deus.

P/ Lucas – Todas estas incompatibilidades fazem parte das histórias das bandas,
voltando ao caso específico do Hallai...é uma repetição , claro , que com outras proporções...se a gente olha de longe...apenas vê uma época longínqua...com os personagens desta vasta galeria, até com vergonha de ter discutido por tão pouco assuntos não tão sérios como se pensava na época.

R / Necão - Vou citar , também casos aki na “ aldeia “ , João Antônio e Chandi,
Pesão e ZéFlávio , Fernando Ribeiro , Toneco & Ayres , e muitos outros que depois do “Vivendo” , não fizeram mais nada de interessante juntos...digo isso dentro da minha visão de observador e participante do “Vivendo”, as coisas terminaram , as parcerias, e o principal, a amizade acabou...eu senti isso.

P / Fanni – Isto até parece conversa de bar, por isso rola tudo que é assunto,
mas . voltando a fita... após o “cachorro”...?

R / Necão – Me lembro que subi a Dr. Flores, me segurando pelas “paredes”
estava em completa estafa , ...eu morava na Salgado Filho , avenida barulhenta...
o Corujão e o Corujinha , dois bares de alto teor de mulheres, ...agitavam a noite inteira, uma balburdia sem tamanho ... era difícil dormir ...eu levantava cedo para ir para a empresa trabalhar naquele plano mirabolante de “bolar “ um “contra veneno”, para entrar naquele monopólio que estava instalado nas confecções de Porto Alegre...começamos a ensaiar nos dias seguintes para preparar o repertório do Hallai para a grande aventura em Curitiba.

P / Lucas – Os ensaios rolaram sem problemas ,visto tudo que estava acontecendo ?

R / Necão – Aconteceu em mim, uma “metamorfose “,... descobri depois , indo ao médico, que estava com todas as minhas imunidades abaixo do desejado, muito inferior ao índice zero... estava com anemia profunda...os exames confirmaram.... repouso total...o médico , Dr. Pellin, recomendou....o Concerto em Curitiba estava pra acontecer, dali a poucos dias... comuniquei o fato a banda... mas que iria de qualquer jeito... o fato chegou aos ouvidos do Júlio...e quando não mais que de repente , adentrou no meu edifício, Mr. Lee, o cowboy de todos os momentos difíceis, ...o Júlio chegou e disse: “Necão , tu vai comigo , o Bayar e o Bender de avião, não te preocupa , vamos arrasar em Curitiba...... o velho cowboy , que eu e Paulinho , confessadamente tínhamos uma paixão platônica, cresceu 20 metros de altura em nossos corações...”Velho xerife, hei, hei , hei...Pelo grande vale um belo rastro ele deixou/ Cavalgando a noite as estrelas namorou.

P / Lucas – Agora eu entendo as diferenças entre Julio Furst e a Continental que
tu falaste no início do depoimento... O Júlio sempre esteve em parceria com os músicos , devido ao fato que ele, na essência é músico... e esta foi a maior prova
não só da dedicação do Hallai ao movimento, como a seriedade que o Julio dava
aos Concertos “Vivendo a Vida de Lee”. Por tudo isso, é que ficou na história.

P /Fanni – Os bastidores é que revelam o que depois, verdadeiramente vai aparecer no palco, mostrando como isso pode interferir diretamente no rendimento do artista, esta é a tão falada delicadeza que falta a quem lida hoje com a arte...vide o que aconteceu com a LIC no nosso Estado.

R / Necão – A partir de tudo isso, uma paz começou a reinar no Hallai, os ensaios
foram todos geniais , as violas e as vozes na mais perfeita harmonia e ficamos
todos mais unidos.... Curitiba, nos devolveu a harmonia tão perseguida.... comecei
a fazer o tratamento quando faltava uma semana para a viagem...o Dr. Pellin me receitou todos aqueles remédios para os glóbullos brancos , todas as tardes, eu ia na Borges (av.) , para fazer uma série de injeções de óleo na veia , super doída
e que me inspirou para aquele verso da música “Vento Minuano “....Descendo a Borges de Medeiros ú ú ú´...Eu sinto o coice que o cavalo não deu.../ esta musica na verdade foi se delineando com o passar do tempo , ela começou com uma letra e foi se definindo aos poucos , quimicamente ele se definiu com aquelas injeções na veia , na Drogaria Panitz na descida da Borges.

P / Nanda - Vocês prepararam algum lance especial ?

R / Necão – Aconteceu o seguinte : - Certa noite o Júlio nos chamou na Continental e combinamos que no dia seguinte ,ele iria nos esperar na casa dele para nos mostrar uns casacos , que tinham pertencido ao pai dele , ou avô , eu não tô muito lembrado... mas , aí vai a lenda...os casacos foram usados na guerra republicana dos Federalistas, ou no Vietnã... ou na Revolução Farroupilha...ou na Guerra da dos Confederados Americanos , ou na Batalha dos pioneiros do Arizona...era uma história assim...bem depois que o Júlio nos contou este lance,vestimos aqueles casacos que ” caiu como uma luva”, ...nos sentimos verdadeiros guerreiros do Hallai Hallai, e estávamos prontos para lutar no Colorado , no Novo México, ou em qualquer revolução que aparecesse por aqueles dias... se não me engano tinha também uma camisa amarelo ouro, que nós também levamos para o Robson vestir no dia do Concert em Curitiba . Como eu estava em plena metamorfose , afirmo que este fato aconteceu, os detalhes é que podem ser diferentes.

P / Lucas – E aí , a viagem... “Faço a mala depressa uma promessa não vou quebrar / Sigo pela avenida , aeroporto vou viajar... , seguindo o teu pensamento né , Necão...?

R / Necão – Sem dúvida... esta é a lenda marcada no lombo do cavalo Lee , acompanhado de ternura e chumbo grosso ...tipo ... “Desci o rio , subi as montanhas / Pisei com fé, em terras estranhas . ..(InconscienteColetivo)

P / Fanni – Mas o sino toca ,...(-) e a viagem Necão ?

R / Necão – Me lembro (dentro daquilo quem eu falei pra vocês) ...no Aeroporto
estavam o Júlio ...o Bayar... o Bender ...o Egon ...e se não me engano o Kleiton do Almôdegas... e eu naturalmente, já apresentando nas faces um pequeno vermelho
(Simple Red), com o tratamento “puro “ country na veia... A chegada em Curitiba ,
foi festiva..( fotos , chicletes . coca ...uma massaroca pra ´lá... e pra cá.../ nem a Deus uma prece / era o “Vivendo chegando lá)...o Júlio deu muitas entrevistas...o Bender falou também...eu dei uma fala sobre o Hallai... Á Rádio Iguaçu deu as boas vindas ,tinha também Televisão no meio...enfim... artistas chegando a nível profissional para mostrar o” Vivendo a Vida de Lee”, com patrocínio internacional.

P / Lucas - A viagem de ônibus deve ter sido uma festa ?

R / Necão – Só fiquei sabendo depois, foi uma comemoração toda viagem, mas muito cansativa, alguns chegaram sem voz de tanto cantar...mas recuperaram no hotel e tudo bem... o hotel alto nível 5 estrelas...dentro daquela bruma que me acompanhava , lembro que todos os artistas /músicos já estavam no hotel quando chegamos...todos ficaram em seus quartos afinando os instrumentos...passando as músicas ...se preparando para a grande noite do som de Lee... o som Cotempo já estava montado no “Palácio de Cristal” o Egon e o Geraldo junto com o Anele, já tinham todos os “dbs na mão, a iluminação do Oscar já estava sendo afinada...os efeitos do “missiê” Anele, estavam na ponta da agulha... e a coisa toda , estava anunciando “casa cheia”...o que de fato aconteceu....o ginásio quando chegamos estava no maior “agito”, gente pra tudo quanto é lado....cara de festa mesmo...um acontecimento na cidade..”.Living the life of Lee” .

P / Nanda - E a organização, os músicos, a infra disso tudo ,a logística ?

R / Necão – Digo o seguinte... perfeito...o “Vivendo” tinha uma disciplina de meter inveja a todos quantos se aventuraram a fazer algo semelhante... o Júlio estava no paraíso comandando pessoas de alto nível, com os mesmos objetivos que ele ,ou seja, criar um ranking como balizador de tendências...fora do eixo Rio / São Paulo,sem aquela pasteurização toda ...usando por base , uma nova maneira,traçando e ampliando um novo mercado de música que até então era considerado nulo pelos gaúchos e pelo centro do país.

P / Marco - Este movimento poderia na época ,se conectar ,a qualquer coisa
de interesse direto, para o desenvolvimento de novas mídias , como por exemplo:
rodeios, cinema, propaganda e comércio.

R / Necão – É complicado pensar hoje assim , mas o Mr. Lee tinha na mão,um “Almanaque Capivarol” , com todo breviário pronto para concluir o “Coast to Coast, “e pensar depois num protocolo junto as gravadoras para gravar tudo aquilo e fazer história com o crescimento dos músicos, ou mesmo com a entrada de outros artistas de Porto Alegre ,mas enfim é difícil ter um um olho no peixe e outro no gato,ainda mais naqueles tempos em que todos pensavam apenas numa aventura?!?!

P / Lucas – Necão e a noite como foi ?

R / Necão - Maravilha, inesquecível para todos que estiveram lá, estado de graça para os músicos de Porto Alegre, a noite com a temperatura ideal , todos estavam
a fim de tocar e cantar como nunca;
Eu nunca tinha sentido tamanho astral ... quando o Júlio chamou ao palco o Hallai Hallai...foi a maior ovação que todos nós do grupo recebemos de um público estranho a todos nós...a força do programa do Júlio era incontestável...o Hallai rodava em Curitiba a mil..assim como outros grupos que o Júlio colocava ...foi incrível...não conseguimos nos ouvir na primeira música...e escolhemos para abrir o Concerto, os “ Falsos Deuses”, uma canção complicada de vocal e viola, ainda mais com um violão afinado em “D” , que dava toda a conexão para o vocal a quatro vozes...foi uma grande apresentação...que apagou todos os vestígios dos desacertos internos ,que nós todos estávamos passando...O “Cowboy “ foi festa pura,todos cantavam no ginásio...e assim todos

que se apresentaram mostraram valor musical e o” Vivendo”, cumpriu na estrada seu papel de mudar, por uns breves momentos, alguns comportamentos arrogantes de quem não acreditava no som feito em casa. No final do noite , altas comemorações...altas paparías...e , no dia seguinte levantamos voou para Porto Alegre...e aquela coisa no pensamento , vamos avançar para São Paulo.../

O Júlio me deixou na Salgado Filho, naquela paisagem arqueológica de Porto Alegre, que não era na Filadélfia ,senti aquele quadro urbano envelhecido, deixei aquele “american way of life” e entrei no conhecido “ urban way of life” de Porto Alegre, ....”Volto pra casa esquento café no fogão / tomo café brasileiro / e vejo futebol na televisão...! ( Hermes Aquino) .
Passei o domingo com o pensamento em tudo aquilo que tinha acontecido em Curitiba...o “Vivendo” já não era uma coisa neutra, era credível, não era mais experimental, todas aquelas ocorrências davam a sensação que outro processo estava atuando e que iriam mudar a vida de todos os músicos ...era de fato e de direito uma revolução que estava em vias de acontecer .
O primeiro passo já tinha acontecido...e aquele verniz civilizado já estava em nossas peles.

Chegou a segunda feira , voltei a rotina daquela empresa de homens espertos,
que moravam no Lindóia e tramavam planos para comerem um filé servido em carruagens ...! ? ! ?

A noite , na volta ...liguei na 1120 , e o velho cowboy entra a mil...começando tudo de novo...É aki xará, o som natural de Lee, que balançou Curitiba !
As 10:45 o Mr. Lee ,coloca uma música instrumental do Hallai , “Chuvas “ em rodagem máxima ...
                                                                  Continua...





p.s. estes foram os momentos que o Necão, conseguiu lembrar, com relação ao “Vivendo a Vida de Lee em Curitiba, visto tudo que relatou .

 
Isto aconteceu num final de semana do mês de outubro de 1976.
O material fotográfico e jornais da época se perderam no tempo.
Só restaram estas duas fotos do HALLAI HALLAI /CURITIBA-1976
¨
Marco Silveira (copyrightblogdonecão)

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A FILHA DO DR° OZÉAS*





          A FILHA DO DOUTOR OZÉAS

                                                            by*Necão* década 60

Ninguém poderia prever a que horas ela passaria na avenida.
Eu , o Índio, o Zeca, o Lico, o Carlos Baladão,e alguns estranhos a nós;a turma do Agrimer, alguns do Aliança , e outros do Comércio, ficavam também a esperar o inusitado automóvel Ford Perfect (1947), do dr. Ozéas, que todos os sábados , ia buscar sua filha em Porto Alegre, que estudava num daqueles Colégios em que as meninas num “dolcefarniente”, tinham aulas de latim, francês, inglês e eram protegidas dos amores infelizes.



Quando o carro apontava lá no Bar Garça, alguém gritava : é ela ,um silêncio fulminante segurava o último sopro de todos nós, então ela passava como um jato, e depois com um esforço supremo, voltávamos a realidade, e a luz da alma, voltava a acender ... o que tú conseguiu ver... o Zeca bradava, eu vi o cabelo dela, o Índio discursava, pô não deu pra ver nada o dr, Ozéas me paga, não vou mais consultar com ele...o Carlos educadamente , eu vi os braços... o Lico no luxo , as mãos ...que mãos , ela deve tocar piano... eu olhava pro todo , mas não via nada , apenas um vulto , e eu como um náufrago, ficava perguntando como é isso , como é aquilo...enfim !

Todo mundo ficava comentando , levado por um indefinível impulso, toda aquela índole, toda aquela elegância,aquela coisa poética e fidalga da filha do dr. Ozéas.
Aquela “Ilha do Tesouro” em que nós vivíamos por momentos terminava, pois ela morava lá em cima numa casa , que pra nós era um castelo de príncipes e princesas,e que nossa imaginação viajava por ricos toucadores, com espelhos de cristal, com velas côr de rosa muito acima dos primores do luxo.

O engraçado disso tudo, é que ela tinha um lugar especial em nossas cabeças, aquela coisa que a gente guarda na gaveta, e vê, de vez em quando.


O zeca, certo dia fez um desenho da filha do dr. Ozéas,
...me lembro que todos deram opinião pra aquele esboço,
...alguns achavam que tinha de colocá-la num chambre de seda...na parte superior , abaixo da gola um brazão de ouro com um lindo monograma bordado
“A Filha do dr. Ozéas.
                                                                             
Os cabelos lisos natural, tipo assim Natalie Wood, (West Side History);as mãos de Stravinski,longas e cheia de dedos, pra colocar os anéis mais finos da Joalheria Líder, a mais cara da cidade.
Tudo com muita arte, os pés ágeis de bailarina ,um turbilhão de imagens misturados a fábulas antigas de carruagens escarlates, com muitos enigmas.

Tudo era cintilante, e todos chegavam a sentir no ar o perfume da Coty, quando o assunto era a filha do dr. Ozéas.

Nunca chegamos a conclusão unânime quanto ao rosto e ao corpo, ficávamos exaustos de tanta discussão, fizemos até num domingo, uma” campana” perto da casa dela , mas só de longe ela aparecia por entre as cortinas daquelas janelas de cinema.

Ela não freqüentava os Clubes da cidade, raramente saía pelas nossas ruas, a gente pensava nela olhando as estrelas, as flores, nos cartazes do Cine Imperial,ou em alguns versos que de vez em quando a gente ameaçava fazer.

Ela não era aquela coisa de amor eterno, a turma toda pensava nela como uma valsa, um primeiro raio de sol ,naquela cidade que nos acordava aos poucos por detrás dos muros de nossas fantasias de guris.


A nossa comunidade tinha três médicos ...dr.Paulo, dr.Erwino e o dr. Ozéas, este era especial, quando a gente avistava ele na faixa, o assunto era falado á noite, a filha do dr.Ozéas.
Todos dormiam sonhando com a festa nupcial da filha do dr. Ozéas , (-) aquela incrível situação durou alguns belos anos, aquele verniz da nossa juventude encontrava na filha do doutor ,momentos para “papos” de imaculada pureza em busca daquele mistério que ficou inalterado ,pois nenhum de nós, viu de corpo inteiro a filha do doutor Ozéas...talvez o Lico tenha visto , mas não nos contou !

p.s. Quando , pela primeira vez eu vi a foto da Ana Paula Arósio, eu pensei comigo...É a filha do Dr. Ozéas .?!?!(-)





quinta-feira, 1 de outubro de 2009

DEPOIMENTO ( 6 ) Visões de Estrada *

Hallai*Hallai Necão Cast*Paulinho Zam* Mr. Robson


                   * A magía do interior gaúcho nas visões do "Vivendo a Vida de Lee"*

                                                             * Visões de Estrada *
                                                                         Vivendología de Lee*

ENTREVISTADO : NECÃO CASTILHOS
PARTICIPAM
NANDA (ANANDA SOUZA MORAIS) PUBLICIDADE
LUCAS (ALBERTO LUCAS RIBEIRO)JORNALISTA
FANNI (STEFFANI DIAS) (LAY OUT PRODUÇÕES)
MARCO SILVEIRA (ESTUDANTE UFRGS)


CONCERTO Nº 4 / CAXIAS DO SUL/MARÇO/1976
CONCERTO Nº 5 / PASSO FUNDO /AGOSTO/1976
CONCERTO N° 6 / CAXIAS DO SUL/SET/1976
CONCERTO Nº 7 / SANTA MARIA /SET /1976
CONCERTO Nº 8 / PELOTAS /OUT/1976


“Pelo grande vale um belo rastro ele deixou /
Cavalgando á noite as estrelas namorou”
(hallai hallai/ 1976)
Vivendo a Vida de Lee* "on the sky" pelo interior gaúcho*
“é hora de partir , leva o que precisares,
o que pensas que perdurará /
o que quer que desejes conservar,agarra-o depressa/
além está o teu órfão com uma arma /
gritando como um fogo ao sol /
cuidado, já vêm aí os santos/
e está tudo acabado, BABY BLUE” .

                       Dylan*



esquerda p*direita > Sergio(Hallai) Robson (Hallai) Paulinho(Hallai)Necão(Hallai)
em baixo > Fernando Pesão (Mantra) Inacinho(Mantra) João Antonio (Inconsciente Coletivo)
Zé Flávio(Mantra) Beto Roncaferro(Produtor) Tv. Caxias
Todos cantando a música Cowboy*
Lucas / - Como foi a escolha dos músicos para estas viagens ao interior ?


Necão / - Te falo o seguinte, pra mim, os artistas. músicos e todos que trabalhavam na montagem e divulgação dos Concertos, tanto na capital e no interior , já estava formado na cabeça do Julio muito antes das viagens propriamente ditas. O - Vivendo a Vida de Lee - , o time foi este, com raríssimas exeções, ALMONDEGAS, HERMES AQUINO, FERNANDO RIBEIRO,INCOSCIENTE COLETIVO,MANTRA, HALLAI HALLAI, GILBERTO TRAVI E O CÁLCULO QUATRO,A EMPRESA COTEMPO( EGON) O ANELI, O JÚLIO E O BENDER DA LEE... estes eram os músicos que rolavam diariámente no programa do Mr.Lee (Julio Furst / e depois entraram na programação da Rádio Cotinental.
Estas eram as pessoas que estavam sempre na Continental, sempre atentas , procurando sempre dar idéias gravar músicas com o Anele, falar com o Júlio, participar ao “vivo”
quando o “Mr. Lee estava no ar, trocar “figurinhas”, incentivar os lances, trocar energías, e falar sobre música.
Para saber quem realmente fez o “Vivendo a Vida de Lee”basta verificar quem rodava na super quente naqueles tempos (75/76), estes foram os músicos batalhadores que
imprimiram com um “puta astral” e deixaram o nome escrito nas paredes de Porto Alegre através do “VIVENDO A VIDA DE LEE” (1975/1976).


Lucas / - Entendi , é a mesma coisa que dizer que os Beatles participaram de “Woodstok”, mas existe pelo que se lê por aí uma certa confusão. Pois muita gente pensa que “Os Beatles “ participaram do “Woodstook” .


Necão / - Quem vestiu os trajes Lee de “corpo e alma”foram os que eu citei (risos)


Nanda /- A gente tem uma certa curiosidade do perfil desse “povo” todo, como tu conceituas ?
Necão / - É difícil pintar este quadro (hoje),a significação de tudo na época passou desapercebida, hoje eu creio que foi o simbolismo que criou o clima necessário para que tudo aquilo fosse possível. O “ Vivendo a Vida” não subverteu ordem alguma com sua arte , ela também não se desvendou a qualquer um, ela possuia um aspecto harmônico que se revelava nos Concertos e no Rádio. Todos alí
criaram sua própria realidade e o Júlio harmonizou tudo aquilo dentro de uma linguagem pessoal com influência direta do patrocinador.


Nanda / -Poderia dizer que foi mais no campo experimental do que teórico ?
Necão / - Sem dúvida , vamos dizer assim, prudentemente pintando pequenos buquês de flores em vasos de porcelana.
Nanda / - Necão, agora fala destes personagens ?


Necão / - Os ALMÔNDEGAS , já tinham vida própria , e possuíam uma receita acadêmica nutrido pelo Fogaça, que era professor do famoso IPV (cursinho pré vestibular) que na época era o “grande lance “. Eu não lembro muito bem, mas eu acho que os integrantes dos ALMÔNDEGAS , nunca viajaram de ônibus junto com os músicos do “Vivendo”.
Êles já tinham agenda lotada , eu acho que foi isso.
O kleiton era o mais acessível , o restante me parece que vivia dentro de uma pátria mental exclusiva.
HERMES AQUINO , sempre foi artista, amizade estreita, diretamente ligado na música,muito amigo do Anele,sabia utilizar muito bem as experiências visionárias musicais, pródigo em seus segredos, a fixidez á certeza que representava muito no “Vivendo”. A música “Macho Picho”pra mim foi a obra que marcou a estética do movimento.
O hallai sempre teve bom relacionamento com o Hermes, inclusive no Concerto em Passo Fundo, o Hermes chamou o hallai no palco e juntos cantamos “My sweet Lord”, foi um grande momento tipo assim “SOM 4”; até que ficou presença aqueles “ baita magro” fazendo vocal.
FERNANDO RIBEIRO,emoção, que em nós do hallai despertava ,tinha composições de complexidade crescente,alguns aspectos da vida, vivia, como se fossem os últimos, o hallai hallai teve um grande amigo em Fernando , ele muitas vezes esteve em nossos ensaios, e foi num desses,que nos mostrou a música “Quando Viajar pro Norte” ,que o Paulinho fez um extraordinário arranjo para 4 vozes e que o grupo deu uma fantástica intrepretação. Foi em Pelotas que fizemos uma surpresa a Fernando, e pela primeira vez cantamos esta canção... o Fernando estava atrás das cortinas e nós mandamos, no final abrimos em 4 vozes “Pare você já foi longe demais”...longe demais...”
o Fernando gritou antes dos aplausos...bravo...bravo...
inesquecível. Até hoje me emociona....


( pausa , pintou uma forte saudade )


Necão / - Quero deixar registrado também o nome do grande músico que fazia parte da banda do Fernando,TONECO um gentlemann em todos os sentidos, e que namorava uma super gata (será que ele casou com ela?)
O AYRES , era outro músico da banda , figura erudita,muito pouco “papo” ,mas gente boa.


Lucas / - Que força tudo isso , sinto uma coisa assim possante e muito forte, o Júlio teve muita sorte em reunir tudo isso naqueles tempos, mas Necão continua...assim a coisa toda se revela de forma diferente e interessante.


Necão / - INCONSCIENTE COLETIVO, um estilo assim,24 de outubro (street), aqueles 03 jovens bonitos, com a ÂNGINHA dando um toque cheio de sensações de artistas despreocupados que descobrem de repente o mundo, levando algumas “ leis tradicionais” e outras para romper através de suas músicas.
O JOÃO ANTÔNIO , sempre demostrou um interesse genuíno pela música ,sempre preocupado com as afinações dos vocais ,era o mais interessado em que tudo desse certo. O XANDI, no estilo“Bob Dylan”dedicava toda atenção a Ânginha...nem poderia ser diferente, os dois criaram um universo próprio um “lago azul” como Lee jeans. (risos)
Nas apresentações sempre aquele som folk , com muita pureza e beleza...realmente eles eram “Fadas Douradas”.
A apresentação em Pelotas no Theatro Guarany, pra mim foi marcante ...”Abra a janela e respire o novo ar da manhã”...o” Inconsciente” devia ter seguido a estrada, o folk depois estourou no País.

da esquerda p/ direita –Necão (Hallai)Ângela(Incosciente), João Antonio (Inconsciente)& vocalista do Travi (?), esta foto foi em Passo Fundo estávamos preparando um grande vocal que devería ter sido gravado.(1976) Hallai + Inconsciente + Cálculo 4 .


Fanni / - Na verdade eu sinto, hoje, que existia um universo em construção no “Vivendo” fiel a si mesmo.
Marco / - Sim , mas eu acho que esta estrutura mental era unicamente entre o Julio e os músicos , nada mais.

Lucas / - É difícil traduzir com um olhar de hoje, tudo que rolou, eu li certas afirmações no livro da Continental de certas pessoas que não entenderam nada do movimento,pois fizeram afirmações muito simplistas de tudo que houve. Gente citada, que na verdade não viveu nada .


Nanda / - Mas Necão, vamos em frente, nos fala do Mantra.


Necão / - MANTRA , Uma Banda pouco preocupada com a simultaneidade entre espaço e tempo , já naquela época,longos solos do ZÉ FLÁVIO , músico de muito talento para
aqueles dias, sempre alegre, mas levava uma inquietação.
PESÃO , “Batera”, seletivo, ele e o Bebeto Mohr eram os melhores , tinham um capricho total com seu instrumento,aquela “cara” de inglês , Garfunkel, nunca falava de brincadeira era tudo negócio, nada pessoal, este era o Pé.
O INACINHO”, garoto feliz, gente especial, alto astral a gente se relacionava muito bem. O Mantra tinha uma gama inteira de composições derivadas da mocidade que viviam
naqueles momentos mágicos. Muito Bom !


Nanda- Gilberto Travi e o Cálculo Quatro ?

Necão - O TRAVI E O CÁLCULO QUATRO , o GILBERTO
tinha “ tweeter” na voz, eu acho que foi a melhor fase da vida dele, ele deve lembrar com saudade desses tempos . Eles faziam assim , uma música “modern stylle” sob as influências do cotidiano, era a parte dos Concertos da distração do bom humor, me lembro que em Passo Fundo(vê só quanto coisa aconteceu em passo Fundo) o irmão do Gilberto ,que era muito parecido com o Belchior fez um lance genial, o Júlio no meio do Concerto , chegou no micro e tascou:- Estamos recebendo uma visita de surpresa.
Belchior veio especialmente a Passo Fundo para cantar no“Vivendo a Vida de Lee”, foi aquele auê, (Belchior nesta época era o grande ídolo que estava surgindo no Brasil .
Entra no palco o irmão do Gilberto, igual ao Belchior e o Anele tasca a gravação :- Eu sou apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco... a luz baixou e era o próprio BELCHIOR , numa apresentação genial do irmão do Gilberto. O público vibrou como se fosse realmente o Belchior. A Banda e o Gilberto tinham uma singularidade legítima .


Nanda / - Agora o Hallai Hallai, sem dúvida ?


Lucas / - Com a cabeça fria que é bom, afinal já passaram décadas ?


Marco / - E que seja antes da primeira viagem do “Vivendo A Vida de Lee , que dizem que a gente nunca esquece?


Fanni / - Para o quadro ficar completo , nada mais justo.


Necão / - HALLAI , PAULINHO , NECÃO , ROBSON & SERGIO , na verdade um grupo de vocal e viola que nasceu das estradas secundárias da grande Poro Alegre, apesar dos primeiros ensaios terem sido feitos no bairro da Glória .Tocávamos Crosby, Stills & Nasch, nas noites quentes de uma Canoas cheia de bandas e bons músicos, muito antes do “Vivendo”, depois do Rio,depois dos bailes, depois das brigas, depois dos bailes das debutantes , depois das namoradas, descobrimos clima favorável na atmosfera íntima da vida familiar, animados por nossos próprios violões, cuja poesia soubemos extrair.
Paulinho , irmão de fé , desde os tempos da adolescência, até hoje estamos juntos na realidade , nos sonhos e nas canções. Robson o enigmático, mas com muito talento, Sérgio “eu sou nuvem passageira”, que se perdeu por aí. Na verdade este tempo foi um dos melhores vividos pelo Hallai, éramos jovens apaixonados pela vida e pelas circunstâncias. Quando entramos naquele ônibus para a primeira viagem, estávamos inteiro dentro do movimento, acreditávamos em tudo que falavam nos bastidores, éramos infantes do primeiro ônibus “Muitas aventuras seu coração levou/ Mas casou com a mocinha que com um beijo o derrubou”. Este era o Hallai Hallai início de tudo.


Nanda / - Hei , agora o Júlio Furst ?


Necão / - O Júlio é fácil, era o próprio dinamite aceso com o pavio curto, nunca vi o Cowboy triste ou sentado, o dinamismo do Júlio contagiava a todos, não tinha tempo ruim; de natureza artística, sabia tirar partido genial dela.
Sempre mostrou-se sensível ,quando apareciam problemas com o Hallai ; O Júlio sempre teve um pé no “on the road “e outro no” Gran Monde” , ás vezes no asfalto/ ás vezes no campo, não dava colher pra som ruim, e nunca tocou o que não quis, não separava, não discriminava quando o talento falava mais alto . Foi responsável direto pelo sucesso do movimento, nunca pediu “penico” pra ninguém . Cowboy durão. Não permitiu que qualquer ideologia comprometesse a espontâneidade do movimento, a serviço do qual colocou toda energia.


Nanda / - Pra não deixar ninguém de fora dos citados ,falta o Egon da Cotempo, o Bender da Lee e o Anele .


Necão / - EGON DA EGER , era o paizão da turma sempre solícito e educado ,e o BENDER “Bom Vivant”, alto astral,sabe aqueles cowboys do Texas, que estão a fim de festa.
Este era o Bender. O” ANELE O HOMEM DAS ESTAGIÁRIAS”simplesmente uma figura de histórias em quadrinhos que completava a roda do VIVENDO A VIDA DE LEE. Gente , já
ía me esquecendo de um “figuraço” o BETO RONCAFERRO que fazia parte da produção e também dava seus toques.


Lucas / - Pelo teu relato, posso identificar a formação de uma “escola” que ,quer queira ,quer não queira , deixou subsídios históricos que são sempre valorizados por novas cabeças que buscam a reconstituição da nossa “geléia geral musical”, que pra mim, que sempre gostei dos músicos de Porto Alegre é muito importante.


Fanni / - Eu creio que o “Vivendo”, não deixou assim influências , tendências urbanas musicais , mas deixou valores empíricos com métodos simples, o rádio , a música local abrindo espaço , com uma proposta nova para a época, e que hoje o “Buzina” ampliou , com métodos mais concretos e , pelo que sinto de longa duração. Isso tudo quer dizer que a colheita esta sendo feita hoje , o conceito é o mesmo , mas com maior abertura e consciência.
A “Escola do Vivendo”, deixou uma corrente com seus elos abertos. (palmas de todos) klap, klap, klap ...


Nanda / - Necão, conte agora , lances das viagens ao interior ?


Necão / - As viagens foram todas iguais, muito som dentro do ônibus, altos papos, encontros, vocais da hora , prazer eu sou fulano, me lembro que um jovenzinho estava sentado no primeiro banco da frente, eu perguntei quem era ? Eu sou Kalique , respondeu aquele jovem assustado,estou agora fazendo baixo no “Incosciente Coletivo”, sentei ali perto e travamos altos papos sobre música, O Kalique desde aqueles tempos pensava seriamente sobre música,sempre interessado no vocal do Hallai, perguntava muito sobre a “cama” de vocal , como é que nós montávamos
tudo aquilo, depois o tempo provou o talento do kalique na Ginga e grupo Canto Livre .A grande noite pra mim foi em Pelotas,no Theatro Guarani, foi tudo perfeito, antes a Rádio da Universidade fez várias entrevistas com todos , a noite foi de gala , todos os músicos se deram bem, as meninas lindas de Pelotas apareceram e foi uma festa de beleza, na apresentação do Hallai. Preparamos uns” sons” antes do grupo entrar no palco (helicóptero, máquinas, vozes) e o Dominguinhos Martins fez uma introdução pré gravada em estúdio, preparando o clima todo, entramos depois daquela “revolução” e começamos com a música “Natural” que falava de natureza , rios , montanhas, céus, águas, sobre uma cama de viola e vocal ...foi demais ! Me lembro também que o Hermes apresentou pela primeira vez nos Concertos uma música dos Beatles ,”Fool On a Hill “, foi com certeza em Pelotas. O Júlio deu uma “bronca” no Hallai :Pô caras , dois apresentadores, “qualé(-) ...o cowboy aqui sou eu !
Referiindo-se aquela pré gravação do Dominguinhos, aí eu dei uma pá de explicações pro “velho Cowboy”.
- É só um lance, aquela coisa da máquina sendo vencida pela natureza; não sei não ,xará , disse o “cowboy”, mas a coisa toda voltou pra paz ...mas nunca mais colocamos aquilo no ar!!!!! Antes da caravana chegar em Pelotas, O Bayar , que fazia parte da produção, mandou parar o Ônibus, e disse em bom som:- Seguinte, estamos entrando em Pelotas, aqui nesta cidade tem muito militar, se algum de vocês tem alguma coisa que vá contra as convenções sociais, coloquem fora agora...só deu neguinho abrindo a janela e mandando toda aquela “lenha” fora. Coloquei até comprimido pra dor, fora ( lá se foi as minhas cibalenas etc...(risos)
Em Caxias do Sul, aquelas italianas “modelos” de olhos azuis, a gente se achava o máximo, ainda mais com aquele “puta vocal”. Em todos os finais altas jantas, comemorações,abraços,promessas de altas gravações com o Anele, uma festa só ! Na volta de Pelotas tava frio pra caramba, não me esqueço, o Bayar sentou do meu lado tremendo de frio, reparti o cobertor com ele, nunca senti tanto frio. Mas tudo era regado com o sangue da juventude que corria em nossas veias.
Caras, nunca tivemos problemas de espécie alguma , nem em Hotéis,viajens,palco,e nos relacionamentos entre músicos. Existiam alguns “egos”, mas tudo dentro da normalidade. O Hermes com aquela calça de listras, uma vez perguntei a ele , o porquê daquelas calça, ele me respondeu :- Necão, a criançada gosta , lembra os super heróis ! Demais ...demais...! Em Passo Fundo antes de começar o Concerto, estava eu, Paulinho e o Júlio , observando os movimentos...o Júlio , lasca ;
-Vocês vão abrir o show hoje...o Paulinho , tasca:sem essa Cowboy, começar com vocal de cara, vai tirar toda a magia , bota uma voz solo de violão, começa devagar.
O Júlio, responde : - Sem essa devagar, hoje tem que ser no pau, Passo Fundo é dedo destroncado, temos que meter bala ... Caras , a coisa tava ficando preta ; Falei com Paulinho e disse , é mais uma experiência , não podemos correr dessa...ainda mais pro Júlio...o Paulinho não aceitava... pedimos um whiski na ponta do Bar, e as coisas começaram a fluir...cheguei pro Júlio e disse....Cowboy ,manda bala, coloque o Hallai , vamos entrar a mil, cinco minutos só de violas...e depois mandamos vocal , começamos com uma música chamada “Aguias”, que tinha uma letra feérica e um vocal monstro, deu tudo certo !!!!
Todas as cidades do interior que passamos tinha lá, seu lado pessoal e subjetivo, o “Vivendo” passava assim como uma fábula, interferindo por alguns momentos naquelas rotinas do preconceito , do amor e da saudade, por alguns instantes...mas sempre com uma hospitalidade suave e harmoniosa... O “Vivendo” foi uma coisa assim de independência, de conquista, é claro que teve outras causas de merchandising, dinheiro e patrocínio, mas na sua essência o sagrado se manteve...os músicos com valor em si !
Eu pensava naqueles tempos que tudo levaria uma eternidade para se acabar, e que nós nunca sairíamos das terras do “Vivendo”... á noite , naquele ar seco do interior, as estrelas viajavam dentro do ônibus...nada poderia mudar aquilo...living the life of Lee...



esquerda p*direita em cima> Kledir(Almondegas) Inacinho(Mantra) Zé Flávio(Mantra) Robson (Hallai)
Paulinho (Hallai) Necão (Hallai)
em baixo > Zézinho Athanásio - Kiko (Almôndegas) Sergio(Hallai) Fernando Pesão (Mantra) João Antônio (Inconsciente Coletivo)
Beto Roncaferro (Produtor Lee)
Profissionais, músicos e artistas foram estes que começaram as viagens pelo interior do Rio Grande do Sul.
Todos escolhidos por JÚLIO FURST.
ALMÔNDEGAS / HERMES AQUINO /FERNANDO RIBEIRO / HALLAI HALLAI / INCONSCIENTE COLETIVO / MANTRA /GILBERTO TRAVI E O CÁLCULO 4 /
Profissionais: Bender (Lee),
Bayar(studio 2)
Egon (Cotempo) ,
Beto Roncaferro (Continental)
Missiê Anele (Continental)
Mr. Lee *

É AKI XARÁ , O SOM DE LEE , GRAVADO NOS ESTÚDIOS
DA CONTINENTAL, COM RODAGEM MÁXIMA “.

                                                                                         ( Júlio Furst)




                                                                                         Continua...

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

O QUARTO DO LICO*



                                                          O QUARTO DO LICO*
                                                                                                     by* Necão


Foi assim,... Era uma vez um rapaz que morava numa cidadezinha que tinha muita cerração, no inverno tudo era muito frio, e no verão tudo muito quente.
O Lico vinha de uma linhagem familiar muito querida na cidade, seu pai era político, e suas irmãs muito belas.
Tudo girava em torno disso, e a vida corria sorridente para todos.


Mas o Lico era uma pessoa que dava vários sinais de vida,Tinha tempo para a burguesia e, também tempo para o “poor side of town”, que era o meu caso.

O pessoal que morava na “faixa” era considerado elite, a turma lá de cima era o contrário “povão”.

Eu, apesar de morar na faixa, gostava muito da turma lá de cima, sempre tive esta tendência “poor boy”, influência talvez de um tempo familiar muito difícil e também por toques de meu avô que era comunista de plantar batatas no terreiro, e de ler a famosa “Tribuna Comunista”.

O Lico, num daqueles sinais de vida, em que ele era mais verdadeiro, certo dia, se aproximou de nossa turma para aprender tocar violão.
E, como sempre, eu era o mais acessível, ele chegou com aquela alegria , e ali pela música, conheci uma figura fantástica, cheia de sonhos e com um futuro para desfrutar.





                                                                                  Grande Otelo*
Corria a década de sessenta, e o cinema brasileiro estava em efervescência; filmes do Glauber Rocha (Barravento/ Deus e o Diabo na Terra do Sol... Assalto ao Trem Pagador do Roberto Farias... O Bandido da Luz Vermelha do Rogério Sganzerla... Os Cafajestes do Ruy Guerra... também já se falava em Roman Polanski, aquele livro do Morris West “Sandálias do Pescador” era a grande polêmica, pois se referia aos porões do Vaticano, história da ascensão de um Papa negro. Os Beatles e os Stones já faziam barulho,gente de teatro falava muito em Ionesco, a “Legalidade” perpetuava seus hinos, o livro do Capote “A Sangue Frio”, dava um novo norte aos jornalistas escritores, a música “Chega de Saudade” do João Gilberto tocava muito no rádio, Fidel Castro já estava no poder em Cuba, a “Doce Vida” do Fellini, passava no Cine Imperial, a Marilyn Monroe era a musa, e o Cândido Portinari pintava a papoula da lua das mulatas.


Esta era a cena, o “quantum, sem lenço e sem documento” o crescente da lua nova partindo para um carnaval no quarto do Lico.
A elite da cidade frequentava o quarto do Lico, era uma coisa assim “privê”, só para amigos que se “becavam” bem.
O quarto do Lico ficava nos fundos da casa dos pais, era uma espécie de “bunker”, ali só entrava quem realmente tivesse alguma condição financeira ou artística.



A década em que tudo começou*

A primeira vez que adentrei naquele quarto “surrealista”,tudo que eu tinha visto em matéria de estética foi pro saco.
Todo mundo falava ao mesmo tempo, as legendas se misturavam, não sobrava nem fuligem de incêndio, todos falavam de tudo, das meninas da tabacaria, das “loras” do “Meu Cantinho”, das gurias “lá de cima”, das balas de hortelã,do “escurinho do Cine Palácio”, dos homens de “chifre” do bolão do Aliança, das invocações dos “guris da Vila Osório, do cinema francês, do Alain Delon, da Brigitte Bardot e também da nova guria da fazenda que prometia futuros papos para noites quentes”.


Aquele quarto não servia para túmulo de santo, os sapatos sempre estavam em cima do guarda roupa, as roupas sempre fora do armário, o criado mudo falava, garrafas de fogo paulista e também aquelas garrafas de vinho frugal, onde todos bebiam para preparar a noite, naquela cidade sesssentista sob a música dos “Indomáveis”, que rachava as paredes do Clube do Comércio.
Assim era o Lico, um garoto feliz, que tinha uma galera de ouro!


Um texto escrito a máquina, num papel de folha de almaço me chamou atenção, na primeira vez que estive lá, peguei estes escritos, que guardo até hoje, e que resume e define aqueles tempos da primeira mocidade de todos aqueles guris, que sonhavam em namorar as meninas, mas bonitas da cidade.
Este é o texto que estava colado com durex na porta do quarto do Lico no lado de dentro. (anos sessenta)
“Depois de ter estudado o amor nos livros dos que o analisam, e na pele dos que o fazem, depois de ter interrogado mulheres instintivas e mulheres cerebrais, depois de ter examinado muitos e muitos casos, lido muitíssimas histórias, ouvido respostas de competentes, visto gráficos dos aparelhos que registram as curvas do pensamento, os imprevistos da vontade, as oscilações do sentimento, depois de ter escutado aqueles que resolvem por meio de química os mistérios do amor ,e aqueles que o explicam com a eletricidade, depois de ter dado atenção aos homens frios que o restringem na fórmula de uma equação e os exaltados que o dilatam pelas rimas de um poema, eu começo a pensar que, para compreender alguma coisa do amor, se eu tivesse que adotar um método, adotaria o teu.
- O meu?
- É o método mais racional, mais sério, mais científico, mais positivo.
Sem abrir os olhos, Liana perguntou:
-Mas que método é este?
O juiz curvou-se mais sobre o rosto dela e respondeu:
- Desfolhar malmequeres.
- Bem me quer, mal me quer, bem me quer, mal me quer.
Paris, setembro de 1929.

Este era o Lico, com sua ânsia de viver, de ter amigos, de buscar a arte, de não ter preconceitos, de frequentar todos os lugares, de conhecer gente interessante, de curtir os anos sessenta como se fossem seus últimos tempos na terra. O Lico sempre comandou tudo, com aquele sorriso de “Colégio São José”, adquirido do Irmão Norberto, grande professor, responsável pela hora cívica dos sábados de manhã.

A eternidade naquele quarto tinha passaporte para sempre.
Aquele “intermezzo”, de sair da casa da namorada e ir para o quarto do Lico, para preparar o espírito para cair na noite era algo extraordinário, era a liberdade de pintar e bordar, com tamanha força que não tinha espaço para o hermético e o bolorento era tudo entretenimento.

A primeira “Casa de Cultura”, que eu frequentei, foi o “Quarto do Lico”. Certas noites eram tão afiadas que algumas luzes sobre valores intrínsecos seguiam itinerários sem censura. Todos ali, esparramados em almofadas de
pena de galinha, com os braços falando pela boca, tal era o entusiasmo de cada encontro.

O Lico sempre roubou a cena, agia como um veterano ator, mesmo quando estava sendo sincero. Todos curiosos, olhavam para aquele maravilhoso espetáculo, com o Lico comandando aquelas trepidações dos anos sessenta.
Existia um duplo sentido no Lico, ele, com aquela ironia de beira de mar, tirava “sarro” de tudo, achavam todos aqueles caras de uma “caretice” de general, mas curtia tudo aquilo sempre alegre, atirando no vento todas aquelas palavras que engravidavam na boca de outras pessoas.

O menor e o grande separados por centímetros, tudo se misturava, nem café nem torta de maçã, era o Lico. “bola pra frente a qualquer custo”; chegavam certas horas que todos ficavam sedentos, rebeldes e impertinentes e começavam a discutir sobre qualquer coisa ridícula.

Aí, o Lico introduzia um fim, naquela reunião de fim de semana, e todos iam para o Clube Aliança, continuar aqueles papos intermináveis e nenhum de nós saía ferido.
Juvenis, eis o que éramos.


p.s. estes escritos vão para todo pessoal que curtiu aquelas noites feéricas no “quarto do Lico”, e também para as musas inspiradoras: Nena, Maria Luiza, Marne, Ruth, Conceição,Maria Rita,Marilena,Solange,Leila,Beth,Nena do Lico,Gessy,(da Fazenda), Nilza Vera, Sandra, Mariza, Maria da Graça, Maria Aparecida, Lorena, Auda, Verinha, Carmem, Vera (filha da dona Alba), Antonieta (sincachambor), Shirlei (da Malta).
p.s. em especial a minha querida negra Iara, que morava na frente da casa do Lico, com o qual me casei em 1971....
Década de “60”, isto aconteceu!