quinta-feira, 25 de junho de 2009

VILA PILAR*

VILA PILAR
(ROMANCE RUSSO)
- Final década /50 -

by / NecãoCast

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Este verísmo pode estar do teu lado agora, em qualquer lugar , basta você olhar e escrever, 

            comigo, aconteceu assim ...

O ambiente da rua Gravataí já te levava a uma atmosfera psicológica profunda , uma estranha galeria de tipos humanos .

O grotesco , o trágico do cotidiano, depositados numa terra fértil com construções rígidas , mas que não se amoldavam gratuitamente a nenhuma fórmula .

Uma tempestade de neve eterna ,descia sobre a minha cabeça quando eu dobrava a esquina da “Gravataí” para entrar naquela rua da minha infância .

Alegorias, tapete mágico,cabelos inarredáveis...tudo isso e mais um pouco, quando eu encontrava a Laura, a Helena e a “Tia Perica”.

Era uma coisa genuinamente russa, parecia que eu estava em S.Petesburgo ou coisa que o valha.

Uma linguagem especial acessível , com uma melodia de nobreza ,  vinha sempre delas.

Logo depois do portão tinha um monte de lenha, e aquele perfume “Lemmer” solto no ar.

Aquilo tudo parecia ter sido fotografado da “Gazeta de Moscou”, a fábrica com aqueles tonéis de essências para a fabricação daqueles perfumes de “Ucrânias” e “Sibérias”.

Tinha também o Paulo, o Ândia e a Ivone; e uma figura impenetrável que era o “Tio Henrique” .

Ele parecia um antepassado, um homem da floresta selvática, orgulhava-se de sua nacionalidade, e gostava muito de um biscoito molhado no chá.

 Quando estava embriagado chorava, “que vida de cão”….dizia ao vento ...mas era uma “montanha”, jogava boliche como ninguém e dava uma palmada muito forte ,quando encontrava algum conhecido pela rua.

O “tio” Henrique , tinha vindo para este mundo para montar em touros , mas fabricava perfumes.

O final da década de cinquenta estava terminando na rua Gravataí e uma colorida realidade pictórica surgia junto com uma invencível tristeza.

A tia Pilar (Perica),era um fiel retrato da alma russa, mesmo tendo origens argentinas ,era de uma notoriedade especial dentro da família, a irmã mais velha, a conselheira, tinha paixão pelas viagens, sentia-se recompensada pela posição que ocupava ,
 e com os filhos compartilhava seus prazeres.

A tia Pilar era uma mulher grande e calma, não era modesta , orgulhava-se de seus filhos , principalmente da Helena e da Laura,com aqueles magníficos cabelos penteados, saias godês , blusas de banlon, ao som de “rock around the clock”

 que eu ouvia no radio Kliper , num espaço de tempo tão longo , que eu não entendo como coube dentro daquele rádio.

 A Laura era aquela coisa Rita Haywort misturado com Ava Gardner e a Helena que já era “lora” ,
 levava o estilo Gingers Rogers misturado com Marilyn Monroe com uma pitada de Brigit Bardot .Os olhos das duas eram semelhantes aos mistérios do espírito santo .

Nas festas de final de ano, a “Vila Pilar” parecia uma cauda de pavão, o céu sempre estava claro mesmo a noite;
meu coração batia com ímpeto, todos juntos, a família viva, era um conjunto elegante , com o título : MEU FILHO É MAIS BONITO QUE O TEU !

A “Vila Pilar”, mantinha na sua própria senha o mito das possibilidades infinitas , mas ao seu lado corría uma mística que apontava para um lugar que não teria um “happy end” feliz.

A única certeza que eu levei depois da “Vila”, foi que eu tinha sido criança, tinha pulado na grama sob as árvores sombrias , enquanto a mãe, me acompanhava.

Tudo que eu senti e vi, dentro daquele mundo de tempestades nunca saiu de minha cabeça,
era sempre uma revolução que estava em marcha, uma casa de aparência robusta e bem alimentada, mas tinha sempre uma expressão faminta, de uma fome voraz e desesperada de vida.

Hoje eu tenho certeza que nadei nas águas turvas do rio Volga, e não sabia de nada.

“ The answer, my friend / is blowin`in the wind /
The answer is blowin ìn the wind .
(Bob Dylan)
- The end -